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Defensor acusa Braskem de tentar silenciar a Defensoria 2g543

Ricardo Melro rebate acusações contra ele e apresenta documentos que comprovam denúncia 4j135n

Por Ricardo Rodrigues - colaborador / Tribuna Independente 12/06/2025 07h38
Defensor acusa Braskem de tentar silenciar a Defensoria
“Querem esconder do mundo a odiosa prática da mineradora”, afirma o defensor público estadual Ricardo Melro sobre a denúncia feita - Foto: Sandro Lima

A Defensoria Pública do Estado (DPE) e a Braskem firmaram um acordo para a mineradora indenizar moradores das encostas dos Flexais, que tinham perdido suas casas com as chuvas que castigaram Maceió. O temporal provocou queda de barreiras na região das Quebradas e pelo menos três moradores perderam tudo. Valor do acordo para cada família desabrigada: R$ 211 mil, sendo R$ 200 mil por danos morais, R$ 5 mil de auxílio desocupação e R$ 6 mil de ajuda de aluguel.

O acordo foi assinado no dia 24 de maio, entre as partes, mas sem a necessidade do sigilo das informações, conforme documento anexado aos autos pela Defensoria. Dois dias depois, os advogados da Braskem entram com outra petição, com data de 26 de maio, reiterando o pedido de homologação do acordo, citando os mesmos moradores beneficiados, os mesmos valores (R$ 211 mil), mas dizendo que as informações seriam sigilosas. Quando os próprios beneficiados já tinham assinado um documento, com data de 6 de maio, abrindo mão do sigilo do acordo.

Como a Defensoria anexou o acordo (assinado por ela) à ação civil pública que move na Justiça Federal contra Braskem, mostrando que essa iniciativa poderia ser replicada para outros moradores dos Flexais e das bordas da área de risco de afundamento do solo, a mineradora – alegando “quebra de sigilo” – entrou com uma reclamação na Justiça Federal contra a DPE. Para o defensor público estadual Ricardo Melro, a reclamação além de não ter motivo, representa uma “tentativa de silenciamento da Defensoria”.

Na reclamação, a Braskem a alega que o acordo teria sido feito “sob sigilo” e que o mesmo havia sido quebrado quando a Defensoria divulgou, nas suas mídias sociais, a situação dos moradores que tiveram suas casas destruídas pelas quedas de barreiras, durante o temporal. Com isso, os advogados da mineradora entraram com uma reclamação na Justiça Federal contra a DPE, alegando “quebra de sigilo”, acusado a Defensoria de “litigância de má fé”, cobrando punição e multa para os defensores públicos.

Ao tomar conhecimento dessa reclamação, o defensor preparou a defesa da DPE e a encaminhou ao magistrado que está à frente do processo, na Justiça Federal. “A farsa do sigilo: a Braskem mentiu – vítimas renunciam sigilo”, foi o título do documento encaminhado ao juiz. Nele, a DPE relata que “a Braskem afirma, com teatral indignação, que o acordo juntado à presente ação civil pública estava protegido por cláusula de sigilo e que sua divulgação comprometeria os beneficiários. Mentira deslavada. E, pior: premeditada”.

Em segunda, explica que, no dia 26 de maio de 2025, a Defensoria Pública e Braskem, após relerem a petição anterior, concordaram expressamente que o sigilo seria retirado do acordo. “Nenhuma das partes desejava mantê-lo, tampouco os beneficiários”, enfatizou o defensor Ricardo Melro.

“No entanto, a Braskem, inclusive, preparou nova petição conjunta, que ora se anexa [aos autos], requerendo que o processo e o acordo permanecessem públicos. Porém, em ato de absoluta má-fé, a empresa não deu seguimento e juntou essa petição aos autos originais. Deixou intencionalmente a anterior, que continha pedido de sigilo, omitindo a posterior, fruto de acerto entre as partes”, explicou Melro, ao magistrado.

“Desafia-se a Braskem e seus patronos a negarem que a petição anexada foi elaborada por seus advogados. Se o fizerem, temos os prints das conversas com advogados, comprovando a autoria, o conteúdo e o acordo entre as partes”, acrescentou.

Para o defensor, além de querer silenciar a Defensoria, a Braskem – por meio de seus advogados – tenta impedir que o benefício dado aos moradores dos Flexais, que perderam tudo com as chuvas – seja estendido às demais famílias, residentes nas bordas das áreas de risco do afundamento solo, em Maceió. Isso, segundo ele, criaria um precedente, que a empresa quer afastar de qualquer maneira da ação judicial.

Acordo com órgão foi firmado com aval de laudo da Defesa Civil de Maceió

Na petição da Braskem, os advogados da empresa confirmaram que o acordo firmado com a Defensoria, para indenizar moradores vítimas de queda de barreira, teve como base um laudo da Defesa Civil de Maceió. Conforme consta na reclamação feita contra a Defensoria, o sinistro teria ocorrido na segunda quinzena de maio de 2025, quando Maceió foi castigada por fortes chuvas, recebendo mais de 500 milímetros de chuva em apenas cinco dias.

“Como é de conhecimento público, fenômenos como este criam riscos para imóveis localizados em encostas e barrancos, considerando a estrutura vulnerável deste tipo de construção. A Defesa Civil, então, atestou que três imóveis desta área estavam em situação de grave risco por conta das chuvas e por causa de fragilidades estruturais. Tais imóveis estavam situados na área 01 do mapa da Defesa Civil, isto é, não há ali recomendação de realocação, mas a condição peculiar das chuvas, do relevo e da estrutura construtiva fez com que houvesse uma recomendação específica no caso concreto, desvinculada do PCF [Plano de Compensação Financeira] da Braskem”, argumentaram os advogados da mineradora.

Os moradores beneficiados foram: Marco Antônio de Melo, Sivaneide Lourenço da Silva, Marcelo Thomás Santos de Melo e Thales Matheus Santos de Melo, já qualificados nos autos, sendo um deles menor de idade. Apesar dos beneficiados terem assinado documento abrindo mão do sigilo – conforme documento acostado aos autos pela Defensoria – os advogados da Braskem insistiram, na reclamação encaminhada ao juiz, que o houve quebra de acordo por parte da Defensoria, quando o defensor público divulgou, nas mídias, a situação dos moradores que tiveram suas casas destruídas pelo temporal.

No entanto, a Defensoria não só negou que tenha aceito manter o assunto em sigilo, como questionou a Braskem sobre o interesse da empresa em ocultar da sociedade alagoana o que acontece com as famílias vítimas da mineração. “A quem interessa o sigilo?”, questionou o defensor.

ACORDO FEITO

Por isso, o defensor fez questão de tratar o acordo às claras, sem ocultar absolutamente nada. Pensava ele que não teria problema nenhum divulgar que a “Braskem reconheceu, em acordo com a DPE, a necessária individualização do dano moral, destinando R$ 50 mil para cada uma das quatro vítimas do núcleo familiar, totalizando R$ 200 mil e, por isso, parabenizo-a”, postou Ricardo Melro, nas suas redes sociais.

“Esse é exatamente o reconhecimento que buscamos na ação coletiva de revisão de todas as indenizações por danos morais praticadas no PCF [Plano de Compensação Financeira] - que só foram aceitas pelas vítimas porque, se não o fizessem, não receberiam sequer a indenização dos danos materiais para comprar outra casa. Foi a denominada ‘proposta casada’”, explicou o defensor.

Alguns moradores das encostas dos Flexais perderam suas casas com as chuvas que caíram no último mês (Foto: Edilson Omena)

Em documento encaminhado à Justiça, Braskem critica conduta da DPE

Ricardo Melro espera que “o Poder Judiciário tenha um encontro com a justiça e leve esse fato em profunda consideração no julgamento da Ação Coletiva, que já está com a presente informação nos autos”.

Com base nesse acordo, o defensor juntou toda a documentação e o precedente na ação civil pública, onde reivindica a revisão de todos os danos morais, “para demonstrar que a Braskem sabe que precisa rever sua prática ilegal no PCF”.

Feito isso, o juiz intimou a Braskem para se manifestar. Na manifestação, ao invés de se defender ou reconhecer o erro que teria praticado, a empresa pôs em prática “uma tentativa de silenciamento recheada de mentiras” – nas palavras do próprio defensor público estadual.

BRASKEM CRITICA DEFENSORIA PÚBLICA

A reportagem da Tribuna Independente não conseguiu ouvir a mineradora, sobre a acusação feita pela Defensoria Pública do Estado (DPE), que acusa a Braskem de tentar silenciar o trabalho dos defensores que atuam no caso. O espaço continua franqueado para a defesa e as explicações devidas.

No entanto, na reclamação que fez contra a DPE, a Braskem se defende, por meio de uma banca de advogados do eixo Rio/São Paulo. Na petição encaminhada ao juiz da 3ª Vara da Justiça Federal de Alagoas, lamenta a conduta da Defensoria Pública do Estado (DPE) e tenta desqualificar Ricardo Melro, acusando-o de “litigância de má fé” e cobrando do magistrado punição e multa para o defensor público estadual.

“Abra-se esta petição lamentando a conduta da DPE em juntar aos autos um acordo sigiloso, celebrado em condições absolutamente excepcionais, na noite de sexta-feira e no dia de sábado, para salvaguardar vidas, com o único propósito de fomentar sua tese nesta ação civil pública [em tramitação na Justiça Federal]”, afirmam os advogados da Braskem.
“Como se sabe, chuvas torrenciais atingiram Maceió entre os dias 17.05.2025 e 22.05.2025, tornando urgente a desocupação de certas residências localizadas em área de encosta, em razão do risco de deslizamento. Por conta desta situação, DPE e Braskem atuaram, em conjunto com a Defesa Civil, para um objetivo comum e louvável: realocar esses moradores para um local seguro”, acrescentam.

“Para viabilizar essa realocação, a Braskem prontificou-se a celebrar um acordo com dois núcleos familiares que coabitavam o imóvel, em situação absolutamente excepcional, alcançando, assim, o objetivo comum de todas as partes envolvidas naquela situação de urgência. Foi, portanto, com enorme surpresa e decepção que a Braskem viu este mesmo acordo, que viabilizou a saída de moradores em uma situação de urgência, ser juntado aos autos desta ação civil pública”, completaram os advogados da mineradora.

“Como se vê da petição apresentada pela DPE, isso foi feito não para que a história de cooperação fosse contada ao meritíssimo Juízo, mas sim para se alegar que os critérios excepcionalmente adotados naquele acordo pudessem ser utilizados em todos os outros acordos celebrados com a Braskem, em circunstâncias muito diversas”, concluíram. (R.R.)